PARA NÃO PERMITIR APAGAR DA MEMÓRIA BRASILEIRA
Documentário traz bastidores da trama que levou ao golpe de 1964
Cerca de um ano antes que se completem os 50 anos do golpe de 1964, o documentário "O Dia que Durou 21 Anos", de Camilo Tavares, traz à luz diversos documentos inéditos, sobre os quais por vários anos pesaram cláusulas de sigilo, que comprovam o decisivo envolvimento dos EUA na derrubada do presidente João Goulart e na instalação da ditadura militar no Brasil. O filme estreia em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis e Salvador.
O então embaixador norte-americano no Brasil Lincoln Gordon -- que sempre negou esta participação dos EUA -- é mostrado como um dos principais articuladores do golpe, por exemplo, em áudios da Casa Branca, em que é ouvido em conversas com o presidente John Kennedy e o subsecretário para Assuntos Interamericanos, Richard Goodwin. Uma destas conversas é de 30 de julho de 1962, evidenciando a longa gestação da desestabilização do governo Goulart.
Além de áudios como este, em poder de arquivos como o National Security Archives, também se revela o conteúdo de documentos secretos da CIA, que permitem reconstituir a variedade de ações mediante as quais se realizou esta desestabilização. Caso, por exemplo, da criação de supostos institutos de pesquisa, como o IBAD (Instituto Brasileiro de Ação Democrática) e IPES (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais), que recebiam dinheiro dos EUA e estavam por trás do financiamento de filmes de propaganda, publicações de artigos na imprensa e também de campanhas de diversos deputados e governadores de oposição ao governo.
Além dos raros materiais de arquivo, diversas entrevistas realizadas pelo jornalista Flávio Tavares - pai do cineasta Camilo Tavares - completam o documentário. Uma delas, com o brasilianista Thomas Skidmore, que define Lincoln Gordon (que morreu em 2009) como "um produto da Guerra Fria".
Ele e outros pesquisadores assinalam que os EUA viam Goulart como "comunista" por sua defesa de reformas de base, como uma lei de remessas de lucro que contrariava interesses das multinacionais norte-americanas. O medo era que o Brasil repetisse o exemplo de Cuba, que fizera sua Revolução em 1959.
Não faltam entrevistas com participantes do regime de 1964, caso do general Newton Cruz -- que, curiosamente, faz reparos ao movimento que integrou. Diz ele: "Quando a Revolução nasceu, era para fazer uma arrumação de casa. Ninguém leva 20 anos para arrumar a casa!".
Em outra conversa, o entrevistador Flávio Tavares fica frente a frente com o coronel Jarbas Passarinho - responsável pela assinatura de sua extradição quando, como preso político, foi trocado, junto com outros prisioneiros, em 1969, pelo embaixador norte-americano Charles Elbrick, sequestrado por uma coligação de vários grupos da luta armada.
Neusa Barbosa (uol)
primeira parte
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